Sobrevivendo ao vírus e a bala
O
ano de 2020 não está sendo muito fácil para mantermos rotinas e hábitos
cotidianos, o que antes era “normal” agora vem precedido de aspas e com alerta
máxima de caos no sistema de saúde pública diante a propagação do novo
coronavírus COVID-19.
Uma
realidade que nos era distante agora faz parte do nosso cotidiano, sobreviver
ao covid-19 e se adaptar as novas rotinas e ao isolamento social. O Brasil
gradualmente tem se tornado um dos países com mais casos confirmados para o
covid-19 e também com mais mortes testando positivo para o novo coronavírus.
Ontem 12/05 o Brasil bateu recorde no número de mortes por coronavírus, segundo
o Ministério da Saúde nas ultimas 24h o Brasil registrou cerca de 881 mortes em
todo território nacional causada pelo covid-19.
É
importante ressaltar que até a data desta publicação 13/05/2020, o Brasil tem
registrado para mais de 170 mil casos confirmados para o coronavírus e mais de
12 mil mortes em todos os estados da federação.
O
estado do Ceará tem vivenciado dias difíceis diante a pandemia do covid-19,
notamos diariamente o número crescente de novos casos de pessoas que testam positivo
para o novo coronavírus, assim como tem assustado o aumento de casos de mortes
causadas pelo covid-19. Assim, segundo o jornal “O Povo” com data de publicação
de ontem 12/05/2010, “O Ceará
registra 18.412 casos confirmados, 1.280 mortes e 9.231 pessoas recuperadas da
Covid-19. Os números foram atualizados na plataforma IntegraSUS, da Secretaria
da Saúde do Estado (Sesa), hoje, 12 de maio (12/05), às 17h08min. São 813 casos
e 91 mortes a mais que o registrado ontem”.
Aqui na cidade de Sobral os casos de confirmação de pessoas com o
covid-19 tem aumentado drasticamente, e com esse aumento nos números de
pacientes com covid-19 o que se presencia é o aumento no número de mortes provocadas
pelo covid-19.
Segundo o boletim epidemiológico da secretaria de saúde do município de
Sobral atualizado ontem terça-feira 12/05/2020 às 21:35h, casos confirmados
para o covid-19 no município já chegam as marca dos 580 casos que atestaram
positivo para o novo coronavírus desde o primeiro caso confirmado na cidade no
dia 17/03/2020. Sendo 1449 casos descartados, 19 esperando os resultados e 17
óbitos registrado no município por covid-19.
Fonte: http://www.sobral.ce.gov.br/informes/principais/boletim-covid-19-em-sobral |
Os números infelizmente chegam a assustar e nos causam pavor e pânico
social. A nível mundial, nacional e local o que se tem adotado são medidas
cautelosas para o enfrentamento do covid-19, tendo em vista que a classe
científica tem trabalhado arduamente nos estudos para o enfrentamento desse
novo vírus. As medidas de saúde individual e coletiva atingem diretamente na
desaceleração dessa propagação do covid-19, medidas como o isolamento social
ajudam a barrar e diminuir os casos de contágio pelo covid-19.
As medidas de quarentena tem os resultado previstos para frear esse
aumento de casos de pessoas infectadas pelo covid-19, para isso é importante
que possamos pensar não só do nosso ponto de vista e do nosso lugar de morada,
é necessário ampliar a atenção para com os cuidados e medidas de prevenção
diante a pandemia que estamos passando, pois com esse novo realinhamento de nossas
rotinas muitas pessoas acabaram sendo diretamente afetadas com a perda de suas
fontes de renda, com a saúde mental afetada, tendo que se readaptar as novas
realidades econômicas e socais.
São tempos difíceis e de muito cuidado com o cenário incerto que estamos
passando com essa pandemia. A periferia é a que mais sofre em todos os sentidos
com essa situação de caos em meio a pandemia do covid-19. Muitas famílias tiveram
suas rendas completamente alteradas depois do surto do novo coronavírus aqui na
cidade de Sobral. Além dos cuidados para manter o isolamento social como
ferramenta de combate a proliferação do covid-19, muitas
trabalhadoras/trabalhadores tem desafiado em cenário em busca da sobrevivência
de suas famílias, basta lembrarmos-nos do número de profissionais autônomos que
estão inseridos nos bairros periféricos que de destacam para outros bairros
para garantir o seu sustento e de suas famílias.
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Algumas medidas emergenciais estão sendo adotadas pelo governo federal,
no entanto essa ajuda ainda insuficiente na complexidade de se pensar uma
população tão plural como a nossa brasileira. Algumas ajudas chegam e outras
não, o que tem se notado é a incapacidade governamental do presidente da
república para lhe dar com uma situação emergencial de saúde pública. As
inúmeras irresponsabilidades advindas do planalto central com o aval do senhor
presidente Jair Messias Bolsonaro foram capaz de inflamar e reproduzir discursos
e teorias conspiratórias anti-ciência para um país que sofre o descaso
estrutural de investimentos nas áreas de pesquisa e produção científica.
Não só buscar estratégias para sobreviver ao covid-19, mas também
compreendermos nossas relações solidárias para com os próximos nos servem de
grande valia para superarmos dia a pós dia um momento de pandemia. A
solidariedade entre as periferias é uma estratégia de ação direta para efetivar
a ajuda mútua entre as pessoas. Desse modo, estabelecer redes de contatos nos
meios virtuais é uma ótima ideia para se pensar uma contextualização de atuação
e solidariedade entre as trabalhadoras/trabalhadores autônomos que no momento
estão inaptos para seus fazeres profissionais.
Perspectivas para passarmos por essa pandemia com saúde diante as
narrativas que reafirmam os cuidados e as medidas de proteção sanitária a serem
colocadas em prática dentro da periferia. Notamos que a rotina das
moradoras/moradores da periferia tem sofrida mudanças no que diz respeitos aos
cuidados básicos com a saúde, informações como: lavar bem as mãos ao chegar da
rua, usar máscara, evitar ao máximo a sair de casa e ir no mercantil ou na
bodega mais próxima de casa somente quando for necessário.
Além desses cuidados claro é necessário sempre reforçar os cuidados e a
prevenção com o covid-19, além de sempre reproduzir notícias de fontes confiáveis
e nunca semear noticias falsas, vala salientar que produzir notícias falsas é
crime.
Conflitos territoriais e homicídios
aumentaram no período de isolamento social
O período de isolamento social nos deixou diante uma situação alarmante sobre
a perpetuação da violência no período de quarentena aqui no estado do Ceará pra
sermos mais preciso com nossa análise sobre esse fato social. Não é de se estranhar
que após o período de decreto estadual e municipal de quarentena o número de
pessoas que sofreram algum tipo de violência tem crescido a cada instante.
Para termos um panorama dessa escalda da violência no estado do Ceará
durante o esse período de isolamento social, segundo o site http://observatorioseguranca.com.br/, só no mês de Março de 2020 foram
registrados 359 homicídios aqui no estado do Ceará. Comparando ao mesmo mês do
ano passado, em 2019 foram registrado cerca de 179 homicídios, e ainda
analisando os dadas da secretaria de segurança pública do estado podemos
destacar que no ano em que se registrou número recorde em casos de homicídio no
Ceará, que foi o ano de 2017 com 358 homicídios, o mês de Março desse ano acabou
superando o ano recorde em número de homicídios do estado. Ainda segundo o site
“O crescimento nos assassinatos no Ceará, que já vinha ocorrendo antes
da pandemia, continuou a se acentuar durante o isolamento social. Nos 12
primeiros dias de abril, houve 13 homicídios por dia. A média de assassinatos
em 2020 antes da pandemia* foi de 12 assassinatos por dia. *de 01/01/2020 a 18/03/2020”
Fonte: https://www.instagram.com/redeobservatorios/ |
Não é nossa pretensão nesse texto apresentar as causas ou afirmar
soluções para acabar com a violência como se o fenômeno da violência pudesse
ser combatido como uma dose de remédio que você encontra na farmácia da
esquina. Nossa proposta é antes de tudo agir de forma política e social com
essa reflexão que no texto transversa os caminhos de uma análise social
sustentado no chão da periferia.
Fazendo o recorte territorial para a cidade de Sobral especificamente
para os bairros Terrenos Novos, Vila União e Nova Caiçara, que serão
denominados de Território-1 para uma melhor compreensão quando nos referirmos
sobre os bairros citados. Podemos destacar a partir da vivência no Território-1,
que não tem sido fácil esses últimos meses de março a maio, onde o isolamento
social se manteve com mais forças dentro do território e a comunidade tenta se
adaptar as mudanças vinda com a pandemia do covid-19.
Fonte: https://www.instagram.com/redeobservatorios/ |
Não é só o covid-19 que tem matado e assustado as pessoas na periferia,
o conflito territorial e a bala tem também matado muitos jovens dentro do
território que aqui tomamos como referência. O medo causado pelas disputas
territoriais tem deixado as moradoras/moradores desse território ainda mais
apreensivos do que era antes experienciado, uma vez que mesmo em meio a uma
crise pandêmica de saúde coletiva as ocorrências de violência no território tem
crescido significativamente.
Para termos uma noção mais específica dos números de mortes violentas
registradas no final do mês de Abril até o dia de hoje 13/05, cerca de 4 jovens
foram assassinados dentro do Território 1, 3 por armar de fogo e 1 por arma
branca. O que assusta nisso tudo é que com o aumento desses índices de
violentas na periferia a disputa e o conflito territorial também tem se
agravado bastante, os atentados contra a vida por arma de fogo se tornou um fenômeno
presente no cotidianos desses bairros. A crise do covid-19 é assim acompanhada
por uma crise na segurança pública. As rotinas alteradas pelas ondas de
violência territorial tem perpetuado uma insegurança generalizada com a
população, somada a isso um pânico social frente ao isolamento tomando como
precaução ao covid-19.
São vidas de jovens sendo sumariamente dizimadas como objetos sem importância
para os agenciamentos maquínicos da política. O poder de uma política
programada para acertar os corpos negros e periféricos. Como sobreviver a
pandemia do covid-19 em meio as saraivadas de balas? Talvez os métodos para
sairmos dessa sinuca de bico seja antes de tudo repensar as formulações que
sempre nos colocamos perante a estas situações de crise.
O interessante não seja começar pelas indagações priorísticas do
discurso de poder, ou seja, não começar pelo como, mas iniciar compreendendo a
dinâmica de cada bairro específico. A contextualização do fenômeno da violência
no ambiente periférico nos ajuda a melhorar o nosso campo de visão e atuação,
quando somos nós os afetados por esse fato sociológico que é a violência.
Ser afetado por esse fato sociológico tem sido uma constante na vida de
quem mora, vive e constrói uma militância política/social dentro da periferia.
Não tem sido fácil manter as ações da militância política num território que agrega
números alarmantes de mortes violentas e que também tem apresentado um número
crescente de casos com confirmação do covid-19.
De todos os lados e para todos os lados devemos olhar e nos cuidar,
pensar na vivência coletiva dentro da periferia para que não sejamos apenas
mais um, ou menos um nos números da estatísticas. Estamos passando por um tempo
ruim e logo isso vai passar, o que temos de mais forte nesse momento é pararmos
para compreender que só nós juntos e juntas podemos vencer mais essa batalha.
Os números interpretam uma realidade sem vida, nossas palavras falam e
chegam nas vidas. Apesar de caminharmos com toda cautela possível, mesmo assim,
ainda é possível sonhar na periferia. Estamos vivos, e por vivos estamos na
luta diária para reverter esse quadro que se apresenta para nós como uma
normatização da realidade das periferias, não aceitamos os padrões e nem fomos
programados para morrer tão cedo. Os planos para exterminar a juventude preta
da periferia deve ser imediatamente interrompido. Acredito que é através da
nossa própria produção local que iremos mudar essa realidade imposta, temos a
potencialidade de sermos esses agentes causadores da diferença.
Partindo dessas ideias apresentadas podemos pensar agora de uma forma
plural a relação que o fenômeno social da violência traz para dentro da
realidade da periferia, esse pensar plural é a correlação metodológica de
investigar a violência em seu campo de atuação na periferia com o isolamento
social causado pela pandemia do covid-19.
Das estratégias e ações para sobreviver ao
vírus e a bala
Compreendendo esses panoramas apresentados até agora podemos seguir com
a escritura acionando para caminhos que por ventura venham ajudar a melhorar as
maneiras pelas quais podemos enfrentar um cenário em disputa pelo vírus e pela
violência.
Estamos enfrentando um campo social de luta mais complicado para atuar
comunitariamente, as lutas comunitárias exigem um corpo a corpo que no momento
tem sido deixado de lado para dá lugar a um ativismo virtual pelas redes de
contatos que se formam em agenciamentos para uma melhor fluidez das ações.
Hoje tem se reinventado a postura e a ação das mídias sociais a favor de
uma proliferação de informações e ações que chegam a gerir e conectar novos
espaços e novas lutas. O calor do corpo a corpo é aos poucos adaptado aos vídeos
conferências que ajudam a disseminar conjecturas locais para territórios antes
desconhecidos. Ninguém inventou a roda durante a pandemia, não é sobre essa
perspectiva que encaramos essa realidade dentro do isolamento social, mas sim pensamos
que a ajuda mútua deve chega pelos meios que nos são oportunizados, e os canais
de mídias sociais estão sendo hoje uma importante ferramenta para trabalharmos nossas
ações no meio virtual.
Mesmo diante as dificuldades que estamos enfrentando é importante nos
solidarizarmos e fortalecermos uma economia local onde possa circular uma renda
comunitária que favoreça o comércio local. Pensando nos pequenos comerciantes
de bairro é importante que possamos fortalecer esse comércio local, dando
prioridade nas compras com esses comerciantes autônomos. Conhecer ou divulgar o
trabalho de alguém do seu bairro que trabalhe com artesanato, comida ou fazendo
bicos na construção civil, é uma maneira solidária para mantermos numa rede de
apoio mútuo.
Usar as mídias sociais para informar, ajudar alguém com dificuldade de
acesso a algum benefício social é uma outra de midiativismo que podemos usar
como estratégia de luta perante esse cenário. Sentir um pouco desse termômetro
através das redes não nos traz a pulsação sentida no chão da periferia, mas nos
coloca como ativistas que buscam novas estratégias independentes do campo de
atuação que é lhes dadas.
Reforçando as afirmações do início do texto, não é nossa pretensão trazer
pílulas para acabar com o covid-19 ou mesmo com a violência inserida no
cotidiano da periferia, ao contrário estamos trazendo para a discussão uma
análise social dos fenômenos que se apresentam na realidade dos bairros
periféricos aqui citados. É importante perceber que mesmo com a intenção de
trazer uma provocação e reflexão a cerca dos fatos sociais apresentados aqui,
nosso maior objetivo é pensar em rede de associações maneiras, estratégias,
ideias, ações para adiar o fim do mundo que está aqui batendo a porta.
Nesse sentido se faz necessário compreender que nossa luta dentro e fora
da periferia vai até o último suspiro. Lutas por dias melhores na periferia e
temos ainda muita FOME.
Por Renan Dias
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